Flatulência no Local de Trabalho
Por
princípio, a Justiça não deve ocupar-se de miuçalhas (de minimis non curat
pretor). Na vida contratual, todavia, pequenas faltas podem acumular-se como
precedentes curriculares negativos, pavimentando o caminho para a justa causa, como
ocorreu in casu. Daí porque, a atenção dispensada à inusitada advertência que
precedeu a dispensa da reclamante.
Impossível
validar a aplicação de punição por flatulência no local de trabalho, vez que se
trata de reação orgânica natural à ingestão de alimentos e ar, os quais,
combinados com outros elementos presentes no corpo humano, resultam em gases
que se acumulam no tubo digestivo, que o organismo necessita expelir, via oral
ou anal.
Abusiva a
presunção patronal de que tal ocorrência configura conduta social a ser
reprimida, por atentatória à disciplina contratual e aos bons costumes. Agride
a razoabilidade a pretensão de submeter o organismo humano ao jus variandi, punindo
indiscretas manifestações da flora intestinal sobre as quais o empregado e
empregador não têm pleno domínio.
Estrepitosos
ou sutis, os flatos nem sempre são indulgentes com as nossas pobres convenções
sociais. Disparos históricos têm esfumaçado as mais ilustres biografias.
Verdade
ou engenho literário, em "O Xangô de Baker Street", Jô Soares relata
comprometedora ventosidade de D. Pedro II, prontamente assumida por Rodrigo
Modesto Tavares, que por seu heroísmo veio a ser regalado pelo monarca com o
pomposo título de Visconde de Ibituaçu (vento grande em tupi-guarani).
Apesar de
as regras de boas maneiras e elevado convívio social pedirem um maior controle
desses fogos interiores, sua propulsão só pode ser debitada aos responsáveis
quando deliberadamente provocada.
A
imposição dolosa, aos circunstantes, dos ardores da flora intestinal, pode
configurar, no limite, incontinência de conduta, passível de punição pelo
empregador. Já a eliminação involutária, conquanto possa gerar constrangimentos
e, até mesmo, piadas e brincadeiras, não há de ter reflexo para a vida
contratual.
Fonte: JusBrasil
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